terça-feira, 26 de outubro de 2010

INQUILINO (André Anlub) TROVART


.
Inquilino
Pela sutileza do olhar de Rosa, já sabia o que queria, não devidamente falado, não claramente pensado, mas sempre demonstrava com o olhar o que antes pensara. Um domingo como qualquer outro, frio lá fora, as árvores cobertas com uma fina camada de orvalho balançavam com o vento forte e gelado que vinha do sul. Aqui dentro, nessa casa velha de madeira e forno a lenha, a temperatura era mais amena, enquanto houvesse lenha haveria calor, os cupins comendo as paredes, uma velha escrivaninha no canto da sala brilhava porque recebera um presente meu, uma lata de verniz que achei no porão; fez a mesma que outrora estava sem vida, ficar linda, com jeito pueril, uma anciã tornando-se novamente criança.
Entardeceu, nuvens negras no céu, eu e Rosa no ostracismo nessa casa, sem recursos, com inúmeras goteiras, o que poderia mais acontecer, nos perguntávamos. Lá de fora ouvimos um som estranho um pouco abafado e sem direção, o som foi aumentando, ficando bem mais perto e mais grave, claro e objetivo, era um urso pardo, grande, e pelo cair de suas babas, faminto; corremos para o porão, não havia luz no âmbito, nem pela janela entrava algum filete de luz, a mesma havia sido coberta por pedaços de galhos e árvores que caíram.
A porta da sala foi-se abaixo, o urso havia entrado, foi de encontro a nossa mesa, esbarrou no rádio que caiu e ligou, ficamos todos ao som de uma música calma e bela. Não dando atenção ao ocorrido comeu o resto de provisões que tínhamos, e depois se deleitou, dormindo, com o calor da lareira e ao som de Carole King.

André Anlub (28/6/09)

Nenhum comentário:

Postar um comentário